Para os
agricultores acostumados às inovações tecnológicas, que estão cada vez mais
presentes na vida do campo, o arado com tração animal (arado de boi) pode soar
como algo ultrapassado. No entanto, a ferramenta que começou a ser usada nos
primórdios da Idade Antiga (4.000 a.C) continua sendo uma tecnologia útil para
o pequeno agricultor que deseja produzir com sustentabilidade. De baixo impacto
ambiental, a técnica de aração com tração animal utiliza um instrumento
pontiagudo de ferro para revolver a terra, sem provocar danos significativos ao
solo.
Desde a
sua criação, há dez anos, o Programa Rio Rural incentiva o uso do arado de boi,
pois gera menor impacto para o solo do que a aração com trator. A época ideal
para o seu emprego vai de janeiro a março, em função do período chuvoso, quando
a terra fica mais macia. O produtor Almerindo da Silva, da microbacia
Valão Carqueja, no município de Italva, Noroeste fluminense, aproveitou as
chuvas do início do ano para arar o terreno de um hectare e meio para o plantio
de tomate. “O arado de boi é uma das melhores coisas que existem na roça. O
pessoal diz que é coisa antiga, mas não devia acabar nunca. A planta cresce
melhor e mais forte do que quando preparamos o solo com o trator”, defende o
agricultor.
Apesar de
o tempo de aração de boi ser maior do que o método com o trator, os benefícios
para a natureza do primeiro são enormes. O engenheiro florestal Paulo Saraiva
explica que, com a técnica antiga, a compactação da terra é reduzida, quando se
pensa em médio e longo prazo. “O solo ganha porosidade, a água infiltra com
facilidade e as raízes de plantas conseguem se desenvolver direito. Com o
trator, isso não acontece, pois o peso concentrado nos pneus exerce muita
pressão sobre a terra. Na aração com animais também há compactação, mas ela é
relativamente menor. Isso sem contar que o trator usa combustível e isso polui
o ar”, conclui ele.
Ainda há
outra vantagem ambiental importante a ser considerada no preparo do solo com
tração animal. Quando os animais estão trabalhando, as camadas de solo mais
ricas em nutrientes são revolvidas e ficam na superfície. O processo é inverso
com o trator, pois a pressão dos discos empurra essas camadas para baixo e traz
para cima as faixas de terra mais pobre.
A
legislação e o uso de tratores
Ainda de acordo com o engenheiro, tratores motorizados podem ser usados, mas existem regras específicas. Segundo a legislação ambiental, o trator é permitido apenas em terrenos com ângulo médio de, no máximo, 25 graus. Acima desse limite, o uso das máquinas pode provocar acidentes. Também devido à inclinação, o pneu do trator deixa caminhos morro abaixo. Ao chover, a água passa por esses sulcos e assim começa o processo de erosão. Por sua vez, o solo retirado das encostas causará o assoreamento dos córregos e corpos d’água. Por isso, sempre que a declividade exceder o limite, a tecnologia que deve ser empregada é o arado de boi, que possui baixo impacto.
Almerindo
da Silva, de 71 anos, diz que, por muito tempo, o uso inadequado do trator era
algo comum entre agricultores de sua comunidade. Porém, o efeito negativo
apareceu depois. “Há cinquenta anos, os córregos daqui estavam cheios. Eu até
mergulhava. Com a terra que desceu dos morros por conta da erosão, os córregos
foram enchendo de terra e secando. Me dá tristeza quando eu vejo um trator onde
não devia”, relembra ele.
Produtor
empreendedor
Os produtores recebem incentivos do Rio Rural para adotar o arado de boi por meio de subprojetos como formação de pastagem ou plantio de diversas culturas, em que é preciso realizar o preparo do solo.
O recurso não reembolsável custeia a hora de trabalho do arador e o aluguel de bois, já que em pequenas propriedades o gado mais comum é do tipo leiteiro. O serviço custa, praticamente, metade do valor usado na aração com trator.
O
produtor Adilton Abelha, da microbacia Valão Carcanjo, em Italva, não só é
defensor da aração com bois como também ganha dinheiro com ela. Ele possui dez
animais com os quais trabalha preparando o solo em sua propriedade e nos
terrenos de vizinhos, beneficiários do Rio Rural. “No fim do ano passado, eu
arei sítio de cinco produtores. É bom ganhar dinheiro, mas fico mais feliz
porque esse método ajuda o meio ambiente, acaba com a terra pelada, que passa a
ter pasto forte, bonito, sem aquela terra socada”, orgulha se o agricultor.
Segundo
ele, o ideal é treinar os bois desde cedo para trabalhar com esse processo,
pois nem todas as raças são dóceis. O recomendável é selecionar bois entre três
e dez anos de idade, que podem arar sítios de dimensão considerável,
respeitando-se apenas o intervalo de descanso, para preservar a saúde dos
animais. O arado mais antigo e mais conhecido de todos é de aiveca, feito com
ferro e em formato de “V”, responsável pelo corte da terra.
0 Comentários